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27/06/2012

A chegada






( Leila Rodrigues)


A cor da moda era marrom. Enquanto eu caminhava pelas ruas cheias de lojas e as lojas cheias de roupas, a cor marrom ia entrando na minha cabeça e impregnando minha mente. Até hoje não consigo gostar desta cor. Me assustei com a quantidade de ofertas. E dada a minha condição de recém-chegada e descapitalizada eu não podia fazer mais nada a não ser olhar as vitrines.
Foi um ano difícil, de muita solidão, de pouquíssimos conhecidos, de crise financeira, de saudade de casa. Muitas vezes pensei em parar tudo e voltar para a minha terra, mas algo me manteve aqui. O primeiro casal de amigos, que são amigos até hoje, os vizinhos sempre tão atenciosos e acolhedores. Aos poucos fui descobrindo meus lugares. As praças, principalmente da Catedral e do Santuário, foram minhas grandes companheiras. Só quem passa por uma dificuldade financeira consegue entender a importância de uma praça. A praça não te cobra ingresso nem couver, a praça é de todos e para todos. A minha distração era encontrar um banco vazio e ali observar as pessoas. Um laboratório de idéias para qualquer escritor.
Quando  eu perdia o sono, a janela era a minha parceira. De lá eu assistia os bêbados tentando encontrar o caminho de volta para casa, as turmas contando seus casos pela rua afora às 03:00 da manhã, os desabrigados procurando seus cantos para passar a noite. Casais apaixonados, outros nem tanto, rastros das festas da cidade deixados pelos foliões.
Para mim, a ordem era trabalhar. E trabalhar muito. Mostrar para os meus poucos clientes que eles podiam confiar em mim. E em contrapartida, fazer jus à confiança em mim depositada. Não existia horário para parar, não existia tarefa a escolher. Tudo que havia era um próposito a vencer. E em nome dele eu fiz café, limpei o chão, atendi telefone, anotei recado, vendi, negociei, entreguei, conheci, aprendi e cresci.
Hoje consigo ver o quão importante foi esta fase. Quanto eu aprendi ao fazer cada uma daquelas tarefas! Foi ali, na dureza daqueles dias, na dificuldade daquela situação, que eu me fortaleci, que eu perdi o medo, que eu descobri a minha capacidade de lutar. Muitas vezes desistimos das lutas sem sequer termos lutado, desconhecendo assim, nossas reais forças. Desconhecendo o gigante que existe em nós. Precisei da dificuldade para me experimentar. E foi me experimentando que eu descobri quem eu era.
Para minha alegria, no ano seguinte a cor marrom já havia sumido das prateleiras. A cidade se enfeitava de novo de uma nova cor, a espera de todos os seus fregueses. Vindos de longe, vindos de perto, ou daqui mesmo, lá estavam eles enchendo nossas ruas e fomentando o crescimento da cidade. Só que, desta vez, atrás da cor laranja.



Publicado no Jornal Agora -Divinópolis MG em 29 de maio de 2012
Foto: Christian de Lima


4 COMENTÁRIOS:

Arnoldo Pimentel

Um belo e emocionante texto da amiga Leila.Parabéns pela força que sempre dá aos amigos aqui.Beijos.

Ana Bailune

Lindíssimo texto, que, pelo meu entendimento, associa a cor marrom a um momento difícil da vida... eu adoro esta cor, por incrível que pareça... sou uma das poucas pessoas que veste marrom e se sente bem...

Toninho

Emocionante texto com uma lição de vida,vida que moldada na dureza, não ofuscou a nossa amiga na sua sensibilidade de captar cada movimento de nosso cotidiano e escrever uma cronica de declaração de vida e força de vencer.Será mais uma mineira? Vou lá conhecer Anne.
Bom que voce sempre nos apresenta otimas pessoas e escritores.
Grato sempre Anne.
Abraços.
Bjo de luz nos seus dias.
Sempre minha admiração amiga.

Palavras

Oi Anne querida,

obrigada por divulgar um texto meu!

Foi uma surpresa!

Adorei!

Essa sua iniciativa de divulgar textos de outros autores mostra o quanto você é uma pessoa especial.

Beijos e mais uma vez obrigada! Adorei a surpresa!

Leila

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