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03/11/2012

A casa desmoronada


A casa desmoronada
(Clara)






      Durante praticamente toda a minha infância, morei numa casa bem simples, antiga, com um quintal enorme onde tinham várias plantas, árvores, tipo fazenda. Aquele quintal imenso era meu mundo. Pegava meus brinquedos, minhas panelinhas e brincava de fazer bolo de terra, colocando musgo por cima, como se fosse a cobertura. Uma espiga de milho, ainda verde, fazia as vezes da boneca, e era a aniversariante do dia. Geralmente brincava sozinha, conversava, corria, cantava, inventava...

      Mas nem sempre eu era essa doçura toda; digamos que meu lado perverso às vezes aparecia e uma maldadezinha se aflorava naquela menininha rechonchuda e bochechuda. Coitados dos bichinhos!

      Taturanas e mandruvás eram meus preferidos. O que eu fazia? Escondida de minha mãe, pegava o álcool, o fósforo, pegava a folha com esse bichinho curioso, colocava no chão, jogava um pouco de álcool e tirava este de perto para não fazer um estrago e levar bronca ou surra da mãe, e de longe, acendia o fósforo e.... jogava no bichinho inocente. Não sei que prazer eu tinha em ver aqueles verdinhos ou peludos, e alguns até zebrados, coloridos, com chifres, se contorcerem até ficarem inertes, mas eu prestava atenção e sentia aquele cheiro de queimado, de certa forma, admirada e curiosa.

      Olha, eu já pedi perdão e isso eu não faço mais, tá bom? Era uma criança e tinha minhas arteirices escondidas. Acho que minha mãe nunca ficou sabendo dessa minha proeza, ainda bem.

      Então, dias desses passei naquela rua e a casa não estava mais lá. Desmancharam aquela casa feia, velha, antiga onde passei minha infância. Senti um vazio, como se parte de minha vida tivesse sido apagada, mas sabendo que tudo está em minha memória. Muitas lembranças vieram na minha mente e não tive como não me lembrar desses inocentes bichinhos cruelmente mortos por mim. Aquele abacateiro enorme, que nunca consegui subir em seus galhos, por pavor de altura, também não estava mais lá. Não prestei atenção no que fizeram no local, acho que um espaço aberto para futuros eventos, não sei.

      Uma outra lembrança me veio... um dia, passando da sala para um dos quartos, uma cobra verde saiu da parede, de um pequeno buraco, e quase pega meu pé! Dei um salto para trás e minha mãe veio ver o que era; e a danadinha, acho que por medo dessa assassina de verdinhos, deu ré e voltou para o buraco. Minha mãe, com um pauzinho, ficou cutucando o buraco, na esperança de espetar a peçonhenta e acabar com sua vida. Mas nada aconteceu. Dali para frente, todas as noites, quando me deitava, ficava olhando as paredes, imaginando que aquela rastejante estivesse andando por dentro dela, na espreita, para um dia quem sabe, sair dali e me pegar, por vingança de tanta maldade que eu cometera com aqueles inocentes seres, também filhos de Deus.

      A casa não está mais lá, mas as histórias, as imaginações, o medo dos bichos, as brincadeiras, todas permanecem carimbadas na minha memória.

      Bons tempos, onde os gravetos, a terra, as plantas, os legumes, as flores, tudo se transformava em brinquedos, com histórias com começo, meio e fim.



Visite a autora: CLARA




6 COMENTÁRIOS:

Daniel Costa

Anne

Há realçar o modo tão leve, como a Clara traçou a histografia da sua meninice, num poema género prosa de encantar.
Nota máxima para ela.
beijos

chica

Sempre um prazer ler a Clara!!Legal! beijos às duas,chica

Ana Miranda

Tirando a maldade com os bichinhos, (ah, coitadinhos...) (re)lembrar uma infância feliz é tããããão bom!!!

Tunin

A inocência infantil, leva-nos a praticar essas pequenas maldades, mas faz parte do mundo infantil bem vivido.
Bela crônica!
Abração.

Anônimo

Anne! Linda história da Clara! Um resgate histórico sobre a imaginação. Beijos!

LUCONI MARCIA MARIA

Quanta gente boa com talento ímpar que não conheço, adorei a narrativa, leve fazendo-nos imaginar as cenas, parabéns Clara vou lá pra te conhecer, beijos Luconi

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