RECANTO
ENTREVISTA CARLOS TOURINHO DE ABREU
( Anne Lieri)
Nosso entrevistado nasceu na linda Salvador!
Sua esposa é de Luxemburgo e hoje residem lá!
Viveu sua infância junto ao povo simples de Lajedo do
Tabocal,interior baiano.
Nosso convidado é o escritor de Tábua: Carlos
Tourinho de Abreu!
Recanto- Carlos,onde você nasceu? Onde reside e por que escolheu esse
lugar? Conte um pouco de sua vida atual,familiar e profissional.
Carlos- Olá, Anne. Eu nasci em Salvador, Bahia, Brasil, em 1977,
mas desde que me formei na Universidade Salvador em Administração de Empresas
passei a não mais viver da minha cidade natal. Seguindo oportunidades
profissionais, morei em diferentes cidades, como: Curitiba, Rio de Janeiro,
Toronto (Canadá), Durham (Inglaterra), São Paulo, Londres e atualmente moro em
Luxemburgo. Em 2005 quando decidi fazer um mestrado em Durham, conheci a
minha esposa, que começava seu doutorado na época, e de lá para cá decidi que a
Europa seria o lugar para viver. A minha esposa é luxemburguesa, o que muito
explica o amor que passei a ter por Luxemburgo. Além disso, costumo dizer que
fiz o caminho de volta feito no passado pelos meus antepassados, a maioria de
origem sul-européia. Apesar de ter me afastado de Salvador desde o início do
ano 2000, sempre volto à minha terra, e às vezes passo grandes temporadas, como
em 2010, quando junto à minha esposa conduzimos um projeto de pesquisa na
capital baiana. Hoje trabalho na Universidade de Luxemburgo como colaborador
cientifico e em 2010, durante nove meses, vivemos no Brasil coletando dados
junto a escolas, inclusive de comunidades carentes de Salvador. Falarei mais
sobre o projeto a seguir.
Recanto- Como foi a sua infância? Fale um pouco dessa fase de sua vida.
Carlos- Foi ótima! Tive o privilégio de crescer em uma família de
classe-média em um tempo em que Salvador tinha talvez menos da metade da sua
população atual, onde podíamos brincar na rua, experimentar as liberdades da
vida, mesmo estando em uma grande metrópole. Dos grandes amigos que até hoje
tenho, a sua maioria conheci no meu bairro, brincando na rua. Julgo que essa
convivência foi muito importante na formação da minha personalidade. Além
disso, muito viajava com o meu pai para o interior do estado, já que ele
administrava a fazenda da sua família, por isso precisava estar lá pelo menos
por boa parte da semana. Todas as vezes que a escola me dava uma folga, eu
estava na fazenda com ele. De lá tirei muita inspiração para escrever o meu
primeiro livro publicado. Assim como meu pai, eu também gostava de conviver de
igual para igual com a população mais carente do interior, normalmente
trabalhadores da fazenda, ou moradores do vilarejo vizinho, desse modo podíamos
sentir na pele os seus dramas pessoais, as mazelas da sua vida difícil, assim
como as peculiaridades da sua cultura e até mesmo as suas alegrias. Meu pai
enquanto viveu foi muito querido pelo povo de Lajedo do Tabocal. Fazia
caridade, conversava muito com as pessoas, além de ser realmente um grande
amigo. Escolhi esse lugar para homenagear em Tabua, pois lá vivi anos
inesquecíveis, junto ao meu pai e junto a pessoas de muito tino e sapiência. O
povo simples do interior tem muito conhecimento. Foi uma lição de vida para mim!
Adoro aquele lugar. Obviamente, reinventei o mundo que presenciei, com pessoas
e nomes fictícios, mas obviamente muitas das barbaridades que menciono no livro,
todo mundo sabe que existem até hoje no mundo real do Brasil, principalmente no
sertão e semi-árido nordestino.
Recanto- Poderia nos falar sobre o seu livro “Tabua”? Faça um pequeno
resumo da história para nós. Por que esse título?
Carlos- Como já mencionei acima, o livro se passa em Lajedo do
Tabocal, na época um distrito do interior baiano, assolado pelas privações
impelidas ao seu povo mais carente. Tabua — não é tábua J — é uma planta típica das margens dos rios e lagos do interior. Há
uma locação especial do livro que faz referência a essa vegetação. É um lugar
calmo, um santuário que o personagem principal se refugia. A história narra a
vida de Guina, um sertanejo forte que tenta vencer todas as dificuldades da sua
infância, até então muito comum e sofrida. Mas um golpe do destino faz com que
Guina se veja fora de Lajedo, tendo que lidar com uma aventura particular e
violenta ainda em tão tenra idade. Tabua toca em problemas importantes do
Brasil dos anos 80, e por que não dizer que esses problemas perduram até os
dias atuais. Digamos que as agruras de hoje sejam os reflexos da indiferença
dos governantes dos anos 80! Quem não leu no jornal da semana passada artigos
ou notícias sobre assassinatos encomendados, epidemia de viciados em drogas,
exploração na zona rural, massacres de lavradores, trabalho escravo, corrupção
política, educação agonizante, etc e etc? O enredo de Tabua traz à tona todos
esses infortúnios que ainda não foram resolvidos no Brasil por falta de vontade
política.
Recanto- A história se passa entre 1980 até a atualidade. Por que escolheu
essa época e qual a mensagem que deseja passar aos leitores?
Carlos- Escolhi justamente os anos 80 para mostrar que o Brasil
pouco evoluiu no âmbito social nas últimas duas décadas. Tabua vem
como um alerta, mostrando ao leitor que essa história bem que poderia se passar
nos dias atuais. Obviamente não se pode comparar o Brasil da década de 80 com o
Brasil de 2011, pois o mundo mudou como um todo, evoluiu tecnologicamente e
seguiu seu caminho rumo à modernidade. No entanto, apesar do
Brasil ter alcançado a marca da sexta economia do mundo, ainda engatinha quando
tratamos de distribuição de renda. Os mesmos magnatas continuam com a
maioria do capital em seu poder, enquanto grande parte da população sofre com
os velhos problemas que assolam o Brasil. Fome, violência, educação precária,
saúde às moscas, dentre outros problemas, podem ser presenciados em qualquer
cidade brasileira de forma bastante presente. Isso sem contar a corrupção
impregnada na cultura política do nosso país... Esta sem dúvida é que gera
todos os outros problemas, pois desviam descaradamente os altíssimos impostos
pagos pelos nossos contribuintes, sem reinvestir na sociedade.
Recanto- O personagem Guina foi inspirado em alguém especial? Fale um pouco
desse personagem.Deixe um link onde as pessoas possam adquirir seu livro.
Carlos- Como disse anteriormente, Guina, assim como os outros
personagens do livro, são fruto da união de características de várias pessoas
que conheci durante a minha vida. Nenhum personagem dos meus livros é baseado
100% em uma pessoa. Guina em especial, eu tentei extrair as aspirações, sonhos,
preocupações, o jeito de falar, de alguns garotos que conheci em Lajedo do
Tabocal, e até mesmo em Piritiba, cidade onde a minha mãe foi criada. Para criar Dona
Letide, a mãe de Guina, por exemplo, me inspirei no comportamento das catadoras
de café que trabalhavam incansáveis na lida de Lajedo. Inclusive muito do seu
jargão, que incorporei ao romance, eu mesmo usava quando por lá andei.
Tabua pode ser adquirido nas maiores livrarias brasileiras e no meu
website:
Recanto- Como se sente quando escreve? O que significa a literatura na sua
vida?
Carlos- O ato de escrever é uma
forma de pôr para fora tudo o que você está sentindo naquele momento da sua
vida. É como se um emaranhado de emoções, percepções, reflexões,
conclusões estivessem pairando dentro do seu cérebro e no instante em que você
escreve consegue-se dar sentido e, por que não dizer, vida, a uma linha de
pensamento. A literatura para mim é um retrato do que está acontecendo na
sua época. Seja uma reflexão atual do passado, ou uma atual contemplação do
presente ou quem sabe até do futuro. Resumindo, é a forma com que os escritores
entendem o seu mundo, no seu tempo. E o melhor de tudo é que esse registro fica
para a posteridade. Essa é uma boa forma de tornar-se imortal!
Recanto- O que você acha das redes sociais? Qual o significado delas em
nossa vida hoje? Elas ajudam na divulgação de seu livro?
Carlos- Acho ótimo, caso sejam usadas com responsabilidade. Para os
imbecis que usam esse meio para disseminar o racismo, a intolerância e o
preconceito, deviam haver leis mais severas, por que lugar de criminoso é na
cadeia, mesmo que se escondam no anonimato das grandes redes. Mas há também o
lado bom das redes, pois reaproxima as pessoas que fisicamente estão tão longe. No meu caso,
por exemplo, vivo em Luxemburgo e seria impossível divulgar o meu livro e blog
não fosse pelas redes sociais. Para ser mais exato, não estaria nem dando essa
entrevista, pois não teria lhe conhecido, Anne. J Sem dúvida,
o facebook é uma grande ferramenta de divulgação! Por isso, caro amigo leitor,
não hesite em compartilhar essa entrevista! J
Recanto- E as escolas de hoje? Qual sua opinião sobre elas? Acha que temos
um país onde a leitura é incentivada? Pode comparar com o ensino fora do Brasil
que conhece?
Carlos- Infelizmente as escolas de hoje não têm os
investimentos necessários para que consigam prover um ensino de excelência.
Digo, as escolas públicas, pois as particulares contam com o apoio das altas
mensalidades pagas pelos mais privilegiados do nosso país. Quanto à
leitura... o que eu posso dizer. Se não há educação de qualidade, é óbvio que
não vai haver estímulo à leitura. É frustrante saber que grande parcela da
nossa população mal sabe ler e às vezes não passam de analfabetos funcionais.
Esse na minha opinião sempre foi o problema chave do Brasil. O raciocínio é
simples, segue uma cadeia: má educação gera um povo incapaz de se informar, que não
desenvolve senso crítico, que é facilmente manipulável, que vota errado, que
elege porcaria, que alimenta a corrupção, que assola esse mesmo povo perdido
nas trevas da ignorância. Um bom comparativo entre as escolas do primeiro mundo e as escolas
brasileiras pode ser lido nesse
artigo.
Agora voltarei um pouco aos resultados do projeto que nós da
Universidade de Luxemburgo conduzimos no Brasil. Durante 9 meses coletamos
dados em escolas publicas e particulares de Salvador e São Paulo, no intuito de
descobrir
se a inteligência dos alunos era afetada de acordo com o seu nível
sócio-econômico. Parece uma pergunta de resposta óbvia, mas nunca ninguém havia
feito uma abordagem científica a esse respeito. Nesse link pode-se ter maiores
informações sobre a pesquisa que conta com a direção da Doutora em Psicologia
Pascale Engel.
Vale a pena ler aqui: Memória operacional
essa abordagem factual a respeito da
segregação ocorrida no nosso país.
Recanto- Você tem algum projeto para um novo livro?
Carlos- Sim. Por sinal acabei de escrevê-lo na semana passada. É
bem difícil escrever um romance quando se tem que dividir o seu tempo com a sua
profissão, o seu ganha pão. Infelizmente não consigo viver de literatura, por
isso, escrevo à noite, nos horários vagos. Assim sendo, demora bastante. O novo
romance que escrevi por exemplo, comecei em Janeiro de 2011. Quase dez meses de
trabalho. Mas valeu a pena! Ficou ótimo! Trata-se de uma história que vai
mostrar muito a respeito da imigração européia do final do Século XIX. A narrativa
acontece em dias atuais, feita por uma senhora cuja família migrou do sul da
Europa para o interior da Bahia, mais especificamente perto da região de
Piritiba e Mundo Novo, em tempos de muitas dificuldades. Esse livro reata um
laço entre o Velho e Novo Mundo, presente no DNA da maioria dos brasileiros de
hoje em dia. É uma história meio que autobiográfica da minha família
materna, que assim como muitos dos antigos colonos, tanto sofreu até conseguir
“fazer a América”.
Recanto-Fale um pouco dos seus blogs e sites. Como começou a blogar? Deixe
os links para as pessoas conhecerem.
Carlos- Eu tento atualizar semanalmente o meu blog de artigos. Normalmente
só publico textos escritos por mim, muitas vezes bem ácidos e contestadores. A ideia do
blog me veio ao voltar para Luxemburgo depois desta última temporada em
Salvador. Uso o blog como uma forma de protesto contra tudo o que sinto que
está realmente errado no nosso país. E como tem coisa errada... pena. Dessa
maneira, tenho muito o que abordar, e quem sabe como se seguindo o
velho exemplo da historia do beija-flor tentando apagar o incêndio da floresta,
tento fazer a minha parte. É pouco, mas mesmo distante fisicamente estou sempre muito
presente e atento aos problemas que afligem o Brasil. Quero muito ver um Brasil
melhor, sem tantas injustiças!
Recanto- Agora é o momento “Marilia Gabriela”. Eu falo uma palavra e você
diz o que te vier á cabeça.
Uma música- Qualquer uma da Legião Urbana!
Recanto- Deixe um pensamento, uma palavra ou uma frase que goste para
nossos leitores.
Carlos- Seu coração é livre, tenha a coragem de segui-lo.
Obrigado, Anne!
Muito obrigada pela gentileza de sua entrevista!
Adorei conhecer mais a respeito de sua vida e sua obra!
Espero que tenha muito sucesso, pois seu livro é maravilhoso e
merece uma atenção especial de todos os leitores!
Visite o autor em seu site:
8 COMENTÁRIOS:
Ah que ótima entrevista, adorei! Sucesso pro Carlos e beijo, beijo para os dois!
She
Gostei bastante da entrevista, foi prazeroso conhecer o Carlos e principalmente sua visão política. Seu sonho Carlos, é compartilhado por muitos outros brasileiros, um dia de tanto desejar, vamos transformar esse sonho em realidade. Agora vou dar um pulo em seu blog. Sucesso para você!
Oi Anne,gostei da entrevista, muito sucesso para o Carlos, depois vou lá conhecê-lo.
Beijos pra ti e pra ele!
Gostei muito da entrevista.Pelo nome reconheci logo uma família baiana onde fiz grandes amigos entre eles.
Parabéns a vc e ao Carlos ,uma p/ descobri-lo e o outro por se deixar descobrir.
Abraços
Olá Anne,
Excelente entrevista, parabenizo o entrevistado pelo livro, e pelo sonho em ver um Brasil igual para todos... Um dia esse dia chegará, pois os bons, são maioria!!!
Parabéns, sucesso!!!
Adorei conhecê-lo!
Abraços aos dois!
Caros amigos e colegas!
Obrigado pelos comentários! Fico muito feliz por saber que gostaram da entrevista! Um grande abraço e espero conhecê-los qualquer dia!
Carlos
Amigos, assistam esse filme. Ele é um ótimo teaser para Tabua.
http://www.youtube.com/watch?v=h-Xmdry4gCM
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